quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

DA PRIMEIRA (e não definitiva) IMPRESSÃO ou A DOÇURA DO MUNDO

"O melhor lugar do mundo é um só, perto de quem amamos" Thrity Umrigar (escritora e jornalista Indiana radicada nos Estados Unidos)


Eu estou na Índia. Cheguei a Mumbai, estado de Maharashtra, nas primeiras horas de 26 de janeiro, dia da Proclamação da República. R-DAY como eles chamam. No mesmo dia, eu viajei para Surat, cidade que fica no estado de Gujarat, para trabalhar e voltei para Mumbai na sexta-feira daquela mesma semana. Eu estou vivendo temporariamente em um hotel.
O que que eu estou fazendo aqui? Estou aqui para realizar inspeção de fabricação de equipamentos para a uma companhia de petróleo. Algo que tenho bom domínio. O trabalho em si é fácil, ou melhor está dentro do domínio. Muito embora, trabalhemos seis dias por semana, algo ao qual já não estava acostumado.
Inicialmente, tenho uma expectativa de  contrato com duração de dois anos com a empresa que presta este serviço. Mas está acordado, que eu vou ao Brasil, aproximadamente, a cada 90 dias.

Estou procurando apartamento para alugar, mas o meu pensamento é não compartilhá-lo. Afinal, já sou um homem de certa idade e que não se acostuma mais a este tipo socialização. A dificuldade é que os proprietários pedem o pagamento de uma caução de cerca de três meses de aluguel, mais alguns impostos, além do valor de aluguel para o período. A empresa pela qual estou aqui, disse-me que não tem como adiantar este valor. Esta é a minha única preocupação neste momento. Preciso buscar uma solução para este problema.

A empresa local, onde estou estabelecido, me recebeu muito bem. Eles me deram um modem temporariamente. O que concorreu para eu ter um acesso facilitado à internet. Quem me conhece sabe quanto sou adepto à este veículo. Eu tenho um laptop à disposição e já tenho até um número de celular indiano. Aliás, na Índia todo mundo tem celular.

Eu ainda não tive a oportunidade de conhecer muita coisa. Mumbai é enorme, uma cidade de 19 milhões de habitantes, sendo que a grande Mumbai, oficiosamente, deve ter quase 24 milhões. A cidade tem um litoral muito extenso, mas ainda não fui ver o mar. A cidade poluidíssima. As folhas das árvores são marrons. Tem muito pombo e muito corvo em todo lugar.

Pode ser impressão minha, mas os homens comuns são meio sisudos, em geral, (claro que existem os moderninhos, ocidentalizados) vestem-se de cores pastéis e de camisa de manga comprida, independentemente da estação.. Mesmo na academia, onde vou queimar as calorias dos quitutes, isto me chamou muito à atenção, os sujeitos vão malhar de calça de moletom comprida. Há exceções, lógico. As mulheres são igualmente fechadas, mas usam um colorido lindo nos seus sarees. Elas são bonitas em seus traços, mas não são muito graciosas, muitas beiram o desengonçado. São cheias de adornos, piercings, anéis nas mãos e nos pés, brincos, estas coisas. Aliás, para a “mulherada” ocidental, isto aqui é o paraíso das bugigangas. Penso em minha filha, como ela ia se dar com tantos acessórios.

Os indianos comuns cheiram a sujo e andam com roupas encardidas ao extremo. Mesmo na fábrica, onde o comportamento é mais cosmopolita, é comum sentir-se um cheiro forte de suor nas pessoas. Não vai aqui nenhuma crítica, afinal este pode ser mais um traço cultural que eu, ignorante que sou, desconheço.

O trânsito é muito louco. As vias são no sistema  que chamamos de "mão inglesa". Têm-se muitos carros, de todos os modelos e idades, motos, bicicletas e rickshaws (uma espécie de triciclo motorizado, com carroceria, que serve com táxi), aliás, "uma mão na roda" em alguns momentos. Caminhões coloridos e de todo porte. Todo mundo buzinando o tempo todo. É comum ver-se nos para-choques (não sei se é ainda assim que se escreve, sigo confuso com a reforma ortográfica) inscrições pedindo para buzinar. Vacas comumente são vistas nas ruas. Em Surat, tinha até camelos.

Os contrastes sociais são impressionantes, prédios muito altos e arquitetonicamente belos, misturados a barracos que nem de longe se aproximam aos do Brasil. Gente vivendo na rua é mais comum do que se imagina. No entanto, não se vê violência urbana. Nem assaltos, nem drogados. Raríssimas exceções. A grande maioria não tem vícios. Nota-se certa resignação. Cuidado mesmo, só com os comerciantes dos mercados, o preço pode variar de acordo com sua capacidade comunicação. O mesmo serve para os táxis.

A culinária é variadíssima e ainda não vi "bife" por aqui. A maioria é VEG e sabe fazer com verduras e legumes uma quantidade de pratos que impressiona. A comida, em geral, é apimentada e cheia de condimentos. Muitos destes temperos nos são familiares, o que muda, às vezes,  é a forma de usar. Não tenho problemas com alimentação. Antes, tenho achado este exercício muito prazeroso para meu paladar, só não abuso na quantidade. Quando dá vontade de comer algo diferente, corro para as franchising da Subway, principalmente, Pizza Hut e tantas outras que a gente encontra por aqui.

Tenho ainda dificuldade em me comunicar, porque é a primeira vez que meu inglês sai da sala de aula, eu nunca tinha tido uma experiência internacional, além de que, eles realizam o idioma de um modo um tanto quanto dialetal e de sotaque extremamente marcante. Ainda assim, eu tenho feito alguns progressos. Saio, vou às compras. Já fui até cortar cabelo.

Mesmo com todas as diferenças, eu gosto de estar aqui. Com certeza,é uma terra mística. E algo que me faz sentir bem. Talvez a excitação da novidade.

Eu acho que estou indo bem. Eu faço exercícios físicos. Eu posso tomar uma cerveja de vez em quando e eu tenho um bom sono. Só acho estranho a falta de abraços. Está em mim esta coisa de abraçar e observo que as pessoas não se abraçam por aqui, salvo os rapazes jovens que andam até de mãos dadas...

Um parágrafo adicional:
Demorei pra dar termos definitivos a este texto, pois achei que podia dar contornos líricos a descrição do que vejo. Algo me sinaliza que isso se torna impossível, depois que forjamos a nossa identidade e moldamos o nosso olhar. Minha aceitação a esta nova realidade ainda é difícil e isto nada tem a ver com preconceito ou falta de consciência do que eu vim fazer aqui. Passa por uma questão íntima e visceral. É a dificuldade natural em adotar valores de um outro lugar, que só se manifesta quando não estamos fazendo turismo, mas sim interagindo diuturnamente com um novo ordenamento e estilo de vida,  o qual não nos remete a qualquer pertencimento. Mas esta é tão somente a primeira impressão.Sigo observando e me observando...