(...)Gente do nordeste, do norte aqui no sudeste
Batalhando nesse mundaréu de mundo que só cresce
Só carece
Venha até São Paulo relaxar ficar relax
Tire um xérox, admire um triplex
Venha até São Paulo viver à beira do stress
Fuligem, catarro, assaltos no dia dez
(Venha Até São Paulo - Itamar Assumpção)
Tenho lido e ouvido muitas lamentações, todas relativamente pertinentes, sobre a dificuldade de fazer arte na Bahia, sobretudo em SALVADOR. No meu ponto de vista, tem uma questão básica que acomete a Bahia, como todo, enquanto consumidor de artes. A Bahia não tem público formado para recepcionar, compreender, interagir e valorizar o trabalho nas artes em geral. Há pelo menos 30 anos que esta crise está instaurada. Mesmos as grandes montagens externas são frequentadas, geralmente, por pessoas que vão ao evento mais pela badalação, ostentação de poder aquisitivo do que pelo valor e apelo cultural do que está sendo apresentado. Vale ressaltar, e minha acidez é proposital, que mesmo nestas ocasiões não se isentam de apresentar uma duvidosa carteira de estudante.
Muitos dos meus amigos queixosos culpam o Estado. Eu tenho uma visão um pouco diferente. Penso que, do mesmo modo que a família não pode atribuir integralmente a formação do sujeito à escola, como se faz hoje, não podemos atribuir ao Estado responsabilidade integral por este estado de coisas. Acho, e estou falando como cidadão comum, que existe um visível esforço do governo sim na promoção e difusão cultural, mas também acho que não existe apoio empresarial forte e midiático de outras instituições como vejo em São Paulo e BH, por exemplo. Talvez este seja o maior embargo. Afinal, por que os teatros viram bingo? Por que os cinemas viram igrejas evangélicas? Por que os casarões viram empreendimentos estrangeiros?
Neste ponto, a Bahia urge de um processo de reeducação. O Rio, ainda nem tanto quanto nós, segue o mesmo vexatório caminho. Aqui, a cada dia, se restringem os lugares. Não há espaço para criação diversa e não há retorno quer financeiro, quer de reconhecimento porque não há formação de público e, consequentemente, advém daí o desinteresse do patrocinador e da mídia que querem, de certo modo equivocadamente, retorno e visibilidade instantânea. Este é o circuito vicioso.
As peças que vou assistir em Salvador tem sempre as mesmas pessoas, as exposições, os eventos musicais mais elaborados assim também se processam. Recentemente, fui a alguns espetáculos onde nem 50% das cadeiras estavam ocupadas. A gente sofre pelo artista, pela arte e pelo público baiano que se furta de prestigiar induzido que é, o tempo todo e massivamente, para uma única manifestação.
Nada é tão novo, mas se acentua cada dia mais nos tempos atuais. De tão crônico, talvez não perpasse só pelas iniciativas institucionais, mas e principalmente, na minha modesta opinião, pelo desinteresse sociocultural coletivo que acomete as pessoas. Parece que pensar, refletir, debater nunca está na pauta do dia desta sociedade. A grande massa quer encontrar mastigado para ter o trabalho apenas de engolir. Criticar, bater, desqualificar, destruir, desumanizar demandam mínimo esforço de massa cinzenta e sempre vai haver um pseudo-religioso, um mau repórter, um falso crítico, um mau companheiro de profissão, um jornal interesseiro para fazê-lo em nome do povo e um empresário ganancioso, em busca de retorno rápido, para bancá-los.
Não que isso sirva de consolo, mas conheço muita gente, que desenvolve arte com qualidade, vivendo desta angústia em todas as áreas. O caminho é resistir. Não adianta caçar bruxas, pois elas renascem. Unir-se. Pensar global e coletivamente.
Até porque, há muito, São Paulo não comporta mais tanta gente...