quinta-feira, 6 de maio de 2010

SOBRE O TEMPO E SUA PASSAGEM

Tempo de ser feliz
O tempo é sábio
O tempo é tudo
O tempo é surdo
Está nas lendas
O tempo encerra as contendas
Faz a gente repensar
Nossas verdades e valores
Nossos amores moram lá
Somos cantores, meros atores
Brincando de nos encontrar
É tanta história, de tanto amor
Feliz daquele que o tempo abençoou

E não há jeito desse tempo apressar
Existe tempo de colher e de plantar
De semear alegria
Fazer o povo cantar
Reinventando a utopia
De se eternizar

(Lula Gazineu, Fernando Correa, Hafif)


No ano de 2009, lá bem no comecinho, compus com meus grandes amigos Fernandinho e Gazina uma canção cuja temática é o tempo das coisas. Paradoxalmente, se tem uma coisa que me causou angústia em 2009, foi a espera. A minha ansiedade por acontecimentos, por mudanças e, principalmente, pela resolução de alguns entraves me tornou altamente ansioso. É doloroso saber que você plantou, regou, adubou, mas que a colheita não se dará no tempo da sua expectativa e, muitas das vezes, da sua necessidade. Em alguns momentos não sabia ao certo, se quer se haveria colheita. Pensava: o tempo é tão louco. Ou será que nós é que enlouquecemos ele?
Passei o ano a blasfemar inúmeras vezes contra ele, negando o que dissemos na canção. A sensação que experimentei, em muitas ocasiões, era de que o tempo das coisas acontecerem pra mim era retardado. Assim sofri pelo que não aconteceu, pelo que aconteceu quando já não tinha mais tesão, visto que houvera gasto minha energia quase que completamente na manutenção da perseverança ou, ainda, pelo que acontecera completamente diferente do que planejei. Findei o ano com uma grande certeza: muitos eventos que nos envolvem não estão nas nossas mãos decidir. Aquele jargão, “quem sabe faz a hora” parece não querer surtir qualquer efeito quando a gente vai envelhecendo...
Iniciei 2010, decidido a ansiar menos e viver mais. Esperar menos e aproveitar as oportunidades que surgem fora do script. Dar mais tempo ao tempo para ver se o tempo achava um tempo para olhar para coisas que eu almejava... Foi neste movimento que me mudei para a Índia. Meio sem saber ao certo por que estava indo, quando dei por mim já estava fazendo este movimento. Já contei, em outro momento, como foi que fui parar do outro lado da terra.
Já comentei os contrastes e as coisas que me agradam ou desagradam pelas bandas de lá. Mas não falei da injeção de entusiasmo que experimento neste processo.
Hoje, passados mais de noventa dias, a sensação que tenho é que estou renascendo... Aprendendo a falar, a comer, a me expressar e até a atravessar a rua. Novos cheiros, novos ritmos, quebra de paradigmas, a desconstrução de certos mitos, a construção de outros... Tudo isso tem emprestado um novo sabor a minha vida. Posto em movimento, me vejo reciclando conceitos de vida, bem-estar, poder e trabalho...
Talvez algumas pessoas estejam especulando a cerca do quanto eu possa ganhar. Eu coloco o seguinte: Eu, felizmente, não tenho esta sanha de ganhar dinheiro. Não que não goste de dinheiro.No frigir dos ovos, acho mesmo que este "arame" que se ganha com o sacrifício de deixar seu lar, seus afetos e sua terra, tem um preço que não há nada que pague. Nenhum valor monetário justifica tanta renúncia. Por que fui trabalhar fora do país? Em primeiro lugar, porque tinha uma relação de trabalho que extrapolava o profissional, criei um vínculo emocional com a cooperativa, onde trabalhei nos últimos vinte anos, que não conseguiria quebrar, estando tão perto e vendo pessoas pouco capacitadas desconstruir o meu trabalho de anos de dedicação. Em segundo lugar, fui lembrado por um amigo que havia trabalhado comigo anos atrás, como uma pessoa adequada ao projeto que ele estava desenvolvendo e isso me fez sentir valorizado num momento onde vivia uma enorme desmotivação profissional. Em terceiro lugar, porque passei dos quarenta e cinco e no Brasil, por mais que tenhamos muita bagagem, começamos a perder espaço. Vislumbrei neste projeto uma forma de me manter e melhorar meu currículo e ter uma porta de saída para falta de oportunidades futuras. Claro que tudo isso num nível racional... O que eu não sabia, era que tinha outras buscas menos tangíveis e menos mensuráveis por trás desta minha resolução. Explico-me:
A gente, queira ou não admitir, a chegada na casa dos quarenta anos representa um rito de passagem, tal qual se sucede no fim da adolescência, com uma diferença, temos mais experiência, mas não temos, supostamente, o mesmo vigor e força para reconstruir da juventude com o agravante de parecer que corremos contra o tempo.
É natural que cheguemos a este estágio da vida contabilizando tudo que fizemos, pesando o que ganhamos e o que perdemos e em geral este balanço nos é perturbador. Seres naturalmente insatisfeitos, muitas vezes vemos nossas verdades caírem por terra. Muitas de nossas renúncias se esvaziarem em sentido, independentemente de tudo que realizamos de bom enquanto profissionais e seres humanos. Neste ponto se estabelece um grande vazio existencial. É como se precisássemos de problemas novos que possam nos por à prova. De interesses novos e, principalmente, de impulsos novos. Eu não escapei deste processo...
Intimamente, passado algum período, acho que é isso que me levou a topar este desafio, que não é nada fácil, mas que tem um valor terapêutico significativo em minha vida. Que bom que o tempo me reservou esta colheita em hora tão apropriada...

http://www.youtube.com/watch?v=aC65Z3QegB4

13 comentários:

Fabi disse...

Muito bem....

adriana disse...

Amigo, sempre achei que o tempo cura tudo, sou adpta do jargão" "não há nada que o tempo não cure!". E você é o exemplo mais perfeito do meu entendimento, pois o Sr. Tempo, no seu momento certo te mostrou uma nova oportunidade de recomeço! Aproveite com sabedoria essa oportunidade. E seja sempre feliz!!

bjs no seu coração de sua irmã "branca"

Unknown disse...

Marcia disse... Maravilhoso

Unknown disse...

que essa sua nova empreitada te traga muitos bons frutos e que sirva de exemplo para quem tem medo de comecar mesmo depois dos quarenta muito obrigado ,voce me inspirou a botar em pratica um sonho boa sorte sempre seus amigos nan e tinho

Unknown disse...

Cada dia aprendo mais com vc! Te admiro sempre. Beijãozão. Elce

Unknown disse...

Amigo, hoje entendo o tempo como aliado, sábio professor, não mais o persigo, uso como meu cúmplice e companheiro, tento não mais me estressar e sim respeitá-lo. O grande lançe é identificar o seu tempo, acho que a Índia vai ajudar nesse processo. No seu tempo volte prá gente.Bjos.

Dora Ferreira disse...

Nossa!!! como me vejo nesse texto. Sei bem do que você está falando.
Ah o tempo....
Não sou muito boa com as palavras escritas.
No calor de um bom papo as minhas idéias fluem com mais facilidade.
Felicidades sempre.

Alegria disse...

Tu não sabes como me identifiquei em tuas palavras - Que sabedoria... Quanto a mim, sinto que ainda me esforço para respeitar a verdade que o tempo trás nos acontecimentos em minha vida... Mais uma vez parabéns, adoro ver-te "construindo" fico muito "orgulhosa" de ti. Beijos,

fernando disse...

Parceiro, essa semana recebi um e-mail que falava sobre "Ciclos da Vida", do quão importante é vc perceber o encerramento de um para dar espaço para o surgimento de outro, sem com isso perder os ensinamentos e a memória daquele que se finda. A vida é um eterno renascer e é maravilhoso constatar a sua percepção histórica desse seu momento. Essa sua sabedoria é um dos motivos que me faz seu fã!
Fernandinho

fernando disse...

Parceiro, a vida é um eterno encerramento de ciclos para permitir que outro ciclo se inicie e renove a nossa alegria de viver. Do ciclo que se fecha, apenas as boas lembranças da experiência vivida; do que se apresenta, aquele friozinho na barriga que nos faz sentirmos adolescentes outra vez. E assim, o sábio tempo se manifesta para quem, como vc, sabe desfrutar da sua sabedoria!

Hamilton Hafif disse...

Passei pra me espelhar. Realinhar meu sentimento e me auscultar. Nem sempre é fácil sustentar a mudança. Mas sigo na pegada e em movimento. São quase dois anos. Muitas coisas aconteceram, mas o que é verdade persiste…

Nara Santos disse...

Acabei de escutar!! Tudo passa, tudo muda, apenas o tempo é o senhor de tudo e não muda.
Confesso que a emoção de entender que só o tempo nos ensina a viver me tranquiliza nestes dias de aprendizados.
E sua lembrança neste texto é mais que uma demostração de conexão. Obrigada sempre!
Bjs
Nara

Dilma disse...

Bo, me encanta sua consciência de si mesmoe o respeito que você se tem "é tão bonito quando a gente pisa firme nessas linhas que estão nas palmas de nossas mãos...". Sou sua fã de carteirinha... Vi esta mensagem e achei a sua cara: "Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia e se não ousamos fazê–la, teremos ficado para sempre á margem de nós mesmos.
(Fernando Pessoa)". Beijos, Dilma.